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DE VOLTA

De volta ao ensaio, à repetição infinita com milimétrico melhoramento diário. Já tinha saudades da minha profissão. Trabalhar com a voz é bom, animar bonecos, dar-lhes alma, mas eles fazem as caretas todas por nós — teatro, porra! Andar de rojo, pavonear-se, gesticular, transmitir sensações através do olhar, do silêncio, do grito, da expressão, interpretar, meter-se no físico da personagem, dar contracena, sentir, expôr-se, mostrar-se na montra das emoções, fazer-de-conta à séria e gozar com tudo. Ah, já tinha saudades, sim, muitas.

Passar o texto à mão, pensar nas frases, naquela palavra, naquele medo, naquela convicção, no que ficou para trás — o passado da personagem explica muita coisa —, é necessário aprender nessa história (inventada pelo próprio texto) para deixar fluir a acção sem a barreira da dúvida. Visualizar: fechar os olhos, ver o 'outro' a mexer-se, a agir, a falar, abrir as pálpebras e acordar 'ele', imitando-o a partir de dentro; e tudo rolará sem hesitações a partir desse momento, tudo estará justificado. Depois, é só ajustar, falsear, sublinhar, cortar, moldar, sombrear ou clarear — colorir.

 

11-04-2018

José Nobre

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